“Imposto do Pecado”: como funcionará o Imposto Seletivo da reforma tributária

    Publicado em

    Imposto seletivo sobre cigarros e bebidas alcoólicas

    Entre as mudanças trazidas pela reforma tributária, uma das que mais têm gerado debate é a criação do Imposto Seletivo (IS), popularmente chamado de “Imposto do Pecado”.

    Esse novo tributo, previsto para 2027, tem um objetivo claro: desestimular o consumo de produtos e serviços considerados nocivos à saúde ou ao meio ambiente.

    O IS será somado à base de cálculo dos novos tributos sobre o consumo: a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de âmbito federal, que substituirá PIS e COFINS, e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), de competência estadual e municipal, que unificará ICMS e ISS no chamado IVA Dual. Confira a seguir todos os detalhes sobre esse novo imposto.

    O que é o Imposto Seletivo (Imposto do Pecado)?

    O Imposto Seletivo (IS) é um novo tributo federal que será instituído pela reforma tributária, com um caráter predominantemente extrafiscal. 

    Isso significa que seu principal objetivo não é a arrecadação de recursos para o governo, mas sim a regulação de comportamentos e o desestímulo ao consumo de determinados bens e serviços.

    Definição e propósito

    Popularmente conhecido como "Imposto do Pecado", o Imposto Seletivo incidirá sobre produtos e serviços que geram externalidades negativas para a sociedade, ou seja, que causam danos à saúde humana ou ao meio ambiente. 

    A ideia é que, ao tornar esses itens mais caros, o governo consiga reduzir seu consumo, promovendo hábitos mais saudáveis e sustentáveis. Exemplos clássicos de produtos que se enquadram nessa categoria estão os cigarros, bebidas alcoólicas e combustíveis fósseis.

    Caráter extrafiscal e o IVA Dual

    O caráter extrafiscal do Imposto Seletivo o diferencia dos demais tributos que compõem o novo sistema de Imposto sobre Valor Agregado (IVA dual), como a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). 

    Enquanto CBS e IBS têm como foco a arrecadação e a simplificação da tributação sobre o consumo de forma geral, o IS atua como um instrumento de política pública, buscando induzir mudanças no comportamento da população. É importante ressaltar que o Imposto Seletivo será integrado à base de cálculo do CBS e do IBS. 

    Isso significa que, embora tenha um propósito distinto, ele fará parte da nova estrutura tributária sobre o consumo, incidindo de forma monofásica (apenas uma vez na cadeia produtiva) e sem gerar crédito tributário para as etapas seguintes

    Essa característica visa garantir que o aumento de preço decorrente do IS seja repassado integralmente ao consumidor final, cumprindo seu objetivo de desestímulo.

    Aproveite e confira também: IBS, conheça o novo imposto que substituirá o ICMS e ISS.

    Banner Treeunfe NFe 01

    Produtos e serviços sujeitos ao Imposto Seletivo

    O projeto de lei complementar que regulamenta a reforma tributária detalha as categorias de produtos e serviços que estarão sujeitas à incidência do Imposto Seletivo. A seleção desses itens é baseada em critérios de impacto à saúde e ao meio ambiente, refletindo o caráter extrafiscal do tributo.

    Veículos poluentes

    Veículos, aeronaves e embarcações que são emissores de poluentes e causam danos ao meio ambiente e à saúde humana serão tributados. 

    A proposta é que as alíquotas do Imposto Seletivo incidam sobre veículos automotores classificados como automóveis e veículos comerciais leves, e variem de acordo com atributos como potência, desempenho, densidade tecnológica, etapas fabris no Brasil e categoria do veículo

    Isso significa que veículos mais poluentes ou com menor eficiência energética poderão ter uma alíquota maior. A inclusão de veículos elétricos também está em discussão, justificando-se pelo descarte de peças, como baterias elétricas, que são nocivas ao meio ambiente.

    Cigarros e produtos fumígenos

    Produtos fumígenos, como cigarros, charutos e cigarrilhas, são universalmente reconhecidos como prejudiciais à saúde. A tributação sobre esses produtos é um instrumento eficaz para desestimular o tabagismo. O projeto propõe que os charutos, cigarrilhas e os cigarros artesanais possam ter o mesmo tratamento tributário dos demais produtos.

    Bebidas alcoólicas

    O consumo de bebidas alcoólicas é um grave problema de saúde pública. A proposta é que a tributação se dê através de uma alíquota específica (por quantidade de álcool) e uma alíquota ad valorem (sobre o valor do produto), de forma semelhante ao modelo utilizado para os produtos do fumo.

    Minerais extraídos

    A incidência do IS sobre a extração de minério de ferro, petróleo e gás natural visa compensar os impactos ambientais da atividade extrativista. A proposta prevê a incidência do IS na primeira comercialização pela empresa extrativista, mesmo que o minério seja destinado à exportação

    No entanto, foi determinado pela Câmara dos Deputados que o Imposto Seletivo incidirá apenas sobre a extração de bens minerais, e não mais sobre a exportação. 

    Há também previsão de redução da alíquota a zero para o gás natural que seja destinado à utilização como insumo em processo industrial.

    Bebidas açucaradas

    Após discussões, as bebidas açucaradas, como refrigerantes, foram incluídas na lista de produtos com incidência do Imposto Seletivo. O objetivo é desestimular o consumo desses produtos devido ao seu impacto negativo na saúde pública, contribuindo para o aumento de doenças como diabetes e obesidade. A tributação será feita por meio de uma alíquota específica (por quantidade de açúcar) e uma alíquota ad valorem (sobre o valor do produto).

    Serviços de telecomunicações

    Os serviços de telecomunicações também estão na mira do Imposto Seletivo. A justificativa é que, embora essenciais, o consumo excessivo pode gerar externalidades negativas, como o uso indevido de dados e a sobrecarga da infraestrutura. A proposta é que a tributação seja feita por meio de uma alíquota específica (por volume de dados) e uma alíquota ad valorem (sobre o valor do serviço).

    Energia elétrica

    Por fim, a energia elétrica, um bem essencial, também pode gerar externalidades negativas devido ao consumo excessivo, como o aumento da demanda por fontes de energia não renováveis e o impacto ambiental. A proposta é que a tributação seja feita por meio de uma alíquota específica (por consumo) e uma alíquota ad valorem (sobre o valor do serviço).

    Leia também: IBS, CBS e IS, como os novos tributos vão impactar a emissão de notas fiscais.

    Como funcionará o Imposto Seletivo?

    O Imposto Seletivo, apesar de seu caráter extrafiscal, terá um funcionamento específico dentro da nova estrutura tributária, com regras claras sobre sua incidência, administração e fiscalização. 

    Incidência monofásica e cumulatividade

    Uma das características mais importantes do Imposto Seletivo é sua incidência monofásica. Isso significa que ele será cobrado apenas uma única vez na cadeia produtiva, geralmente na saída da indústria ou na importação do produto. 

    Diferentemente de outros impostos que podem incidir em diversas etapas, o IS busca ter um efeito direto no preço final para o consumidor, cumprindo seu objetivo de desestímulo ao consumo.

    Além disso, o Imposto Seletivo será cumulativo, o que significa que a cobrança não gera crédito tributário a ser compensado nas próximas etapas da cadeia. 

    Isso garante que o ônus do imposto seja integralmente repassado ao preço final do produto, sem que as empresas possam abater o valor pago em etapas anteriores. Essa característica é fundamental para que o IS cum9pra seu papel de aumentar o preço de produtos que se deseja que tenham menos consumo.

    Administração e fiscalização

    A administração e fiscalização do Imposto Seletivo ficarão a cargo da Receita Federal do Brasil. A expectativa é que a cobrança seja simplificada, mas o controle da inclusão do tributo na base do CBS e do IBS, e a fiscalização de sua correta aplicação, serão desafios importantes

    A Receita Federal seguirá as diretrizes do Decreto nº 70.235, de 6 de março de 1972, para o contencioso administrativo, garantindo a segurança jurídica do processo.

    Isenções e reduções de alíquota

    Embora o Imposto Seletivo tenha um propósito amplo de desestímulo, a legislação prevê algumas situações de isenção e redução de alíquota para evitar distorções e garantir a justiça fiscal:

    • Exportações: haverá isenção do Imposto Seletivo sobre exportações, com exceção de bens minerais extraídos, energia elétrica e telecomunicações. Essa medida visa não onerar os produtos brasileiros destinados ao mercado externo, mantendo a competitividade das exportações.

    • Bens e serviços com redução de alíquota: estão previstas situações de não incidência tributária em bens e serviços, com redução de 60% na alíquota padrão, para regimes diferenciados e transporte público coletivo rodoviário e metroviário em áreas urbanas, semi urbanas e metropolitanas. Essas exceções buscam proteger setores essenciais e serviços de utilidade pública. 

    • Gás natural: está prevista a redução da alíquota a zero para o gás natural que seja destinado à utilização como insumo em processo industrial, incentivando o uso desse recurso em atividades produtiva.

    Essas regras demonstram a preocupação em equilibrar o caráter extrafiscal do Imposto Seletivo com a necessidade de não prejudicar setores estratégicos da economia ou serviços essenciais à população.

    Banner fino Treeunfe NFe 02

    Impactos do Imposto Seletivo

    A implementação do Imposto Seletivo trará uma série de impactos para diferentes agentes econômicos, desde o consumidor final até as empresas e a própria arrecadação governamental. Compreender esses impactos é fundamental para se preparar para as mudanças que virão.

    Para o consumidor

    O impacto mais direto e perceptível para o consumidor será o aumento do preço final dos produtos e serviços que forem alvo do Imposto Seletivo. Como o IS é monofásico e cumulativo, seu valor será integralmente repassado ao preço de venda, sem possibilidade de crédito tributário nas etapas seguintes da cadeia

    O objetivo é justamente desestimular o consumo desses itens, e o aumento do preço é o mecanismo para isso. Por exemplo, cigarros e bebidas alcoólicas, que já possuem alta carga tributária, ficarão ainda mais caros. O mesmo ocorrerá com veículos mais poluentes e bebidas açucaradas.

    A expectativa é que, com o tempo, essa elevação de preços leve a uma redução no consumo desses produtos, contribuindo para a melhoria da saúde pública e a proteção ambiental.

    Para as empresas e varejistas

    Para as empresas que produzem ou comercializam os bens e serviços sujeitos ao Imposto Seletivo, os impactos serão significativos. Inicialmente, haverá a necessidade de adaptação dos sistemas de precificação e contabilidade para incorporar o novo tributo. 

    Além disso, a natureza cumulativa do IS pode representar um desafio para os varejistas que adquirem produtos de indústrias, pois o imposto pago na etapa anterior não gera crédito para ser compensado. Isso pode levar a uma absorção de custos adicionais, que acaba sendo repassado ao preço final.

    No entanto, a inclusão do Imposto Seletivo na base de cálculo do IBS e da CBS, que geram créditos tributários, visa aliviar esse ônus sobre o varejista, tornando o sistema tributário mais eficiente e proporcionando maior capacidade de competitividade para as empresas no mercado. 

    A medida busca garantir que o IS não gere distorções excessivas na cadeia produtiva, mas sim cumpra seu papel de desestímulo ao consumo de forma direcionada.

    Para a arrecadação e destinação dos recursos

    Embora o principal objetivo do Imposto Seletivo não seja a arrecadação, ele gerará receitas para o governo. A proposta é que a arrecadação do IS seja destinada a fundos específicos de saúde e meio ambiente, reforçando o caráter extrafiscal do imposto

    Isso significa que os recursos gerados pela tributação de produtos prejudiciais serão utilizados para mitigar os danos causados por eles ou para promover ações de prevenção e proteção ambiental. Essa destinação específica dos recursos confere maior legitimidade ao Imposto Seletivo, pois a sociedade poderá ver o retorno da tributação em benefícios diretos para a saúde e o meio ambiente. 

    A transparência na cobrança, com o valor do imposto destacado na nota fiscal, também permitirá que o consumidor saiba exatamente o quanto está contribuindo para esses fins.

    Reforma tributária e varejo: o que muda para quem vende ao consumidor final?

    Desafios e perspectivas

    A implementação do Imposto Seletivo, como qualquer grande mudança tributária, não estará isenta de desafios. A complexidade do sistema tributário brasileiro e a diversidade de produtos e serviços que podem ser afetados exigirão um acompanhamento cuidadoso e adaptações contínuas.

    Controle e fiscalização

    Um dos principais desafios será o controle e a fiscalização da inclusão do Imposto Seletivo na base de cálculo do CBS e do IBS. 

    Embora a Receita Federal seja a responsável pela administração do IS, a natureza cumulativa e monofásica do imposto exigirá mecanismos eficientes para garantir que o valor seja corretamente repassado ao longo da cadeia produtiva e que não haja sonegação ou distorções. 

    A fiscalização deve ser robusta para identificar e coibir práticas que tentem burlar a incidência do imposto.

    Banner Treeunfe NFe 02

    Adaptação do mercado

    O mercado, por sua vez, precisará se adaptar rapidamente às novas regras. Empresas que produzem ou comercializam os bens e serviços sujeitos ao Imposto Seletivo terão que revisar suas estratégias de precificação, produção e marketing. 

    A busca por alternativas menos prejudiciais ou a inovação em produtos e processos pode ser uma consequência positiva do IS, impulsionando a indústria a se tornar mais sustentável e alinhada com os objetivos de saúde pública.

    Além disso, a comunicação clara e transparente sobre o Imposto Seletivo será fundamental para que consumidores e empresas compreendam o propósito do tributo e suas implicações. A educação fiscal desempenhará um papel importante na aceitação e no sucesso do IS.

    As perspectivas, no entanto, são positivas, afinal, o Imposto Seletivo, se bem implementado, tem o potencial de contribuir significativamente para a melhoria da saúde pública e a proteção ambiental no Brasil. Ao desestimular o consumo de produtos prejudiciais, ele pode gerar benefícios a longo prazo para a sociedade, além de modernizar o sistema tributário e alinhá-lo às melhores práticas internacionais.

    Aproveite e leia também: Empresas terão fiscalização única nos moldes da reforma tributária.

    Um imposto com propósito social e ambiental

    O "Imposto do Pecado" é uma das inovações mais emblemáticas da reformulação tributária brasileira. Longe de ser apenas mais um tributo, ele se configura como um instrumento de política pública com um propósito claro e nobre: desestimular o consumo de produtos que sejam nocivos para a saúde humana e para o meio ambiente. 

    Ao incidir sobre itens como cigarros, bebidas alcoólicas, veículos poluentes e bebidas açucaradas, o IS busca induzir mudanças de comportamento na sociedade, promovendo hábitos mais saudáveis e um desenvolvimento mais sustentável.

    A destinação da arrecadação para fundos específicos de saúde e meio ambiente reforça o caráter extrafiscal do imposto, transformando a tributação em um investimento direto no bem-estar social e na proteção dos recursos naturais.

    Embora a implementação do Imposto Seletivo traga desafios, como a necessidade de adaptação do mercado e a complexidade da fiscalização, os benefícios a longo prazo são inegáveis

    Ele representa um passo importante para alinhar o sistema tributário brasileiro às melhores práticas internacionais, onde impostos similares já são utilizados com sucesso para promover a saúde pública e a sustentabilidade.

    Para empresas e consumidores, a chave para navegar nesse novo cenário é o conhecimento e a adaptação. Compreender as regras, os produtos afetados e os impactos esperados permitirá que todos se preparem adequadamente para as mudanças. 

    O Imposto Seletivo não é apenas um novo imposto; é um convite à reflexão sobre nossos hábitos de consumo e um passo em direção a um futuro mais consciente e responsável para o Brasil.

    A transição está cada vez mais próxima e o momento é repleto de incertezas e ainda não há como afirmar se a reforma aumentará ou reduzirá a carga tributária, mas para quem empreende, é fundamental estar preparado para lidar com as mudanças que estão em curso.

    Fique por dentro de tudo que acontece sobre a reforma acompanhando nosso blog e também nosso quadro Papo de Contador em nosso canal do YouTube. Com a Treeunfe, você sempre tem a informação certa quando o assunto é estar em dia com o Fisco. Até mais!

    Banner Quadro Papo de Contador